domingo, 12 de setembro de 2010



Antes que se perdesse para sempre no infinito, em seu último sopro de esperança, ela foi procurá-lo em seu castelo para dizer que estava morrendo. Mas era de saudades. Temendo que as chamas do amor tivessem se apagado, levou nas mãos uma lamparina. "Quero falar imediatamente com o Monstro de Chocolate, essa separação não está dando certo, ele vai ter que reconsiderar!" - disse ela ao vigia da torre de controle. O vigia a fitou com um olhar de soslaio, meditando sobre o passado, presente e futuro. O fogo que vinha da lamparina esculpia uma silhueta angulosa alaranjada com preto, que lhe conferia uma semelhança inequívoca com um anzol descaído. Um lobo ereto em ofensiva sagital, perdido entre as volutas da fumaça cinza, obrigando-a a alterar a sua rota na mira do arremesso. Como quem não desiste de tentar, ela, por sua vez, ignorou aquele imenso vulto montanhoso - do medo. E antes que ela lhe desse um empurrão, o portão se abriu o suficiente para delinear o perfil de ermitão do Monstro de Chocolate. Foi então que ele a levou para a sua torre aurífera. A ternura com que ele a olhou foi de comover o céu que explodiu cadenciado de estrelas, num festival de luzes que escorreram pela Via-Láctea inteira. Você está brilhando – ele disse, reconhecendo-o em seus olhos. Ela tentava se proteger do encontro daquele olhar iluminado, mas eles a atravessaram com a fúria de um trovão e a velocidade de um raio. Fulminante. Tanto tempo sem vê-lo, sem tocá-lo, temeu que fosse apenas um vulto resplandecente que mudava de cor num esboço giratório, fazendo o mundo tremer num surto evanescente, para não dizer o coração, que, vertiginoso, dilatava dentro daquele corpo tímido que confessava amor em cada gesto. Os golpes dopados daquela voz resvalavam da boca, subindo até o pé dos seus ouvidos, fazendo com que o silêncio viesse abaixo andar por andar nos degraus do desejo. Estavam em transe. A boca os procurava, contando os minutos que faltavam para um beijo que se acontecesse os consumiria por inteiro. Passaram a noite no fogo das expectativas. Não queriam incendiar-se pela pressa. Suportaram as chamas com a paciência dos imortais, e a estratégia das paixões que agitam o mundo. Enterraram aqueles dias de separação num reencontro libertador. Fascinados. Despiram-se apenas com os olhos, enquanto a muralha invisível do orgulho se desmoronava à sua volta. As chamas daquele fogo os consumia lentamente. Não se importaram em morrer um pouco, se fosse de amor.

' Pipa

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