segunda-feira, 16 de agosto de 2010



Parece que o dia de hoje começou há dez anos. Medo de acordar e terem ressuscitado aqueles fantasmas que enterrei com gosto. Centenas de milhares de pessoas sem cor e nem rosto interceptam minha trajetória. Mas nenhum que correspondesse à descrição de “prato branco e raso” do que tem fome de olhar. Este amor tem duzentos anos. Ele tem olhos vermelhos e barba crescida. Às vezes tenho vontade de sair correndo, mas a consciência logo me encontraria e abaixaria as grades, obrigando-me a refazer o caminho de volta. Cada dia que passa, meus olhos estão mais feridos com essa distância. E só prestam atenção no jeito de se desviarem de alguma foice que os rasguem por inteiro. Será que ele foge porque tem medo de não saber o que fazer comigo? Ou tem medo de não saber o que fazer com ele? Eu vou inventar uma agulha de luz para espetar a escuridão. Embora ela torne mais difícil caminhar, eu já atingi o limite das trevas. Suponho, por extrapolação, que eu seja louca. Tenho medo que o anjo da guarda não desça do céu a tempo, e me coloquem numa camisa de força sob os auspícios de um extravagante sanatório, e eu me torne o escândalo predileto dos dissabores da vida. Mas eu vou acordar amanhã, abrir a janela e sol me iluminará me provando o contrário. E vou me acabar de tanto rir. Provavelmente de mim mesma. Não vou mais esvaziar minha alma para alguém que me trata como uma estranha. Como é mesmo que ele era? Estou começando a esquecer? Como demora morrer os amores em nossos corações. Eu tento. Mas o corpo não aceita mais nada. Embora, aparentemente esteja faminto, não vou estendê-lo sobre a calçada para servir de aperitivo aos vira-latas. Não quero me transformar em miniaturas de palitos ossuários na boca de cães lambancentos. Vou deixar que a chuva caia. E, com o tempo, as águas lavem o sangue. Minha vida é um espetáculo babilônico. É como se tudo o que eu tocasse virasse pedra. Aprecio os abismos emocionais. Quase ninguém chega perto. E minha grande ambição, é soltar as correntes da razão e espiar o que há dentro, ainda que ao final me reste apenas a vertigem da queda. Não me contento com formas. Ou toco no fundo. Ou não toco em nada.

' - Pipa

2 comentários:

  1. Tinha que ser dela, Pipa.

    Ela é perfeita!
    Adorooo o blog dela, tudo que ela escreve.

    belo post Schαnα !

    Um abraço meu!

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